Blogoterapia

É um blog sobre psicoterapia, filosofia, arte e o sentido da vida para passar um conteúdo dinâmico e diário, para troca de conteúdos que possa ser terapêutico.

O adestramento da liberdade

Sobre a liberdade, o sentido e a predestinação

A mensagem não está no texto, no livro, no filme ou no curso. A mensagem está pronta dentro de nós e a gente a vê, a percebe ou a lê, quando estamos prontos para recebê-la, assim como o amor que a gente busca, que não está na outra pessoa, mas que é ativado em nossas almas o amor que já está dentro de nós.

A importância do outro é ser a argila, o espelho, a argamassa encima da qual projetamos e preenchemos as nossas faltas, as nossas necessidades no misterioso mundo das trocas entre o dar e o receber. Tudo o que imaginamos estar no outro ou ser do outro, é aquilo que nele projetamos e é também por isto que o grande amor das nossas vidas pode ser alguém vivo ou morto, bom ou ruim e não necessariamente belo, mas é a consequência daquilo que projetamos, edificamos em nossas expectativas sobre o outro.

Qual a importância do outro então? O outro é a flauta de onde retiramos a música, a chave que abre a porta da vida, mas cujos segredos são nossos, a tecla mágica que inventamos e acionamos para a retirada do que precisamos, algo que atende às nossas buscas e a semente sagrada de onde brotam todos os nossos sonhos.

Este outro bem-amado e que nada pode nos oferecer senão o seu ombro e a sua empatia, é alguém que mesmo assim amamos, e vale a pena amá-lo, porquanto, ele é a importante miragem da felicidade, o sol da esperança, a luz que rega a doçura e a realização dos sonhos.

A gente encontra em qualquer pessoa o nosso amor, porque ele está além daquilo que a gente vê, além do ser do outro, onde podemos encontrar o aconchego que sempre esteve dentro de nós e que retorna na medida em que o damos.

A verdade está em quaisquer textos e com o sabor e a textura que a ela atribuímos, a iluminação que pode estar “no manual da geladeira” se o olhamos com um olhar iluminador. A grande mensagem está dentro de nós e não no texto em si, ela que transcende todas as línguas e se mantém pronta, precisando apenas de uma ativação, do despertar que vêm das nossas mais íntimas necessidades para a cura dos nossos desejos, dos sonhos e das expectativas.

A mensagem que nos saciam pode estar nos manuais das máquinas, da moto ou dos ventiladores, etc., na Bíblia ou nos livros sagrados, entrementes pode estar também nas estrelas, nas cartas e na natureza, na beleza da chuva, em quaisquer coisas para as quais olhamos com a força do nosso amor e com todo pendor do coração.

Certa vez um sábio, Bradford Keeney, um destes bruxos que tive a sorte de conhecer, contou-me que “se me encanto com um livro”, um filme, um curso ou numa vivência iniciática; eu não preciso mais me deter neles e nem desperdiçar o meu tempo, porquanto, a sua essência já está dentro de mim, porque ele é apenas um raio que chama a minha atenção para me encantar, me despertar do sono mortal e me acionar.

O olhar do observador vê aquilo que ele precisa ver naquilo que olha. O nosso olhar é um inventor. Porém, o que há de novo nisto, se estas verdades já nos foram tão bem explicadas, como “transferências”, como “projeções” ou sabedorias, ao estilo das semeaduras que as nossas almas não se cansam de fazer, que se encantam e se desencantam milhões de vezes durante a existência?

Precisaríamos estar de prontidão, atentos, despertos e ativados. Estarmos prontos significa estarmos puros, o mais conscientemente possível, nos tornarmos dignos merecedores e estarmos ungidos para nos percebermos num estado receptivo de sede e de paz, coisas que, às vezes, vêm da meditação, do esvaziar das mentes ao abrirmos as mãos das inteligências naturais ou artificiais que na prática não servem para quase nada.

Percebemos o que precisamos com um olhar mais sereno e contemplativo, com o esvaziar da mente e da inteligência, na oração, na vida correta quando somos leais aos nossos ancestrais e aos valores que fluem do amor, da ética, com um estado amoroso de vida e de alma, fazendo apenas o bem que gostaríamos que nos fizessem, ampliando o radar da consciência, percebendo em quaisquer coisas e pessoas e onde quer que seja, a sabedoria que se plasmam no contato com o mundo e gera o que precisamos receber.

Assim enxergamos o que precisamos enxergar para vivermos e fazermos a coisa certa. E qual é a coisa certa? A coisa certa é aquilo que o mundo merece e está ativado para receber, o amor e a generosidade. A coisa certa é aquilo que faz bem para o outro e para nós nas trocas entre o dar e o receber. O dar e o receber, que é a expressão da empatia que só acontece quando percebemos o outro e nos colocamos no lugar dele.

Assim, abaixo todas as soluções mágicas e toda a mendingância espiritual, abaixo as indulgências porque sabemos que o dinheiro quase nunca compra nada que possa nos agregar a paz, a justiça e a serenidade.

Alguns ricos são pessoas inseguras e politicamente enfermas. O que poderia curar é o alívio da culpa e das desculpas, daquilo que nos livram das dívidas e das expiações, da consciência da lealdade ao que é bom e justo e nos fazem dignos merecedores da felicidade sem os sentimentos de culpa e as deslealdades.

Quando fazemos as coisas que estão alinhadas com a justiça e os valores maiores, coisas que todo mundo e toda lealdade sabe muito bem o que é: ou seja, não trair, não matar, não roubar, não viver com avareza e não fazer ao próximo o que não queremos que nos façam, na extrema empatia que é a vivência do amor cotidiano.

A culpa e o sentimento de culpa nossas ou herdados por lealdade aos nossos ancestrais, não nos permitem colher a justiça que precisamos para viver, nem extrairmos da vida aquilo que precisa ser colhido quando estamos “santificados”, ou “sanificados”. Ser santo é ser saudável. Sermos santificado é estarmos pacificados intimamente sem brigarmos com as mazelas do mundo, livres das influências mundanas, é termos a confiança e a fé que oferece o poder dos placebos que nos curam naturalmente, sem que precisemos de mais nada além da lealdade e do merecimento.

Assim, sem culpa e sem nada a ser expiado, a vida se torna milagrosamente terapêutica por si mesma, então você consegue o que precisa e que é seu por direito, sem a necessidade das drogas e de nenhuma terapia, porque a sua cura é construída antes e já está dentro de você a partir da herança e da história dos nossos ancestrais.

O pão de cada dia é a consciência limpa que passa a fazer com que as coisas boas aconteçam, e quando vivemos uma vida ecologicamente correta, justa e livre de todas as traições, nos tornamos felizes e curados sem nenhuma droga.

A palavra “clínica” tem uma origem grega em Kliné e Clinicus em Latim, e que também pode significar “to clean”, que em Inglês é “limpar”, que é a concretização da cura e da limpeza que nasce com as psicoterapias que se reconhecem e primam pelo sentido do “cuidado”, curvando-se sobre aquilo que se adoece pela culpa que nos infectam e que, fazendo a devida assepsia tem o poder de nos curar até de nós mesmos, das alquimias íntimas que fazem de nós, os nossos piores venenos.

Quando a vida não está ungida por um estado de elevada empatia com a existência, com a natureza e com o outro, você não consegue se colocar no lugar de nada e de ninguém, não consegue compreender o que é o arvorecer da árvore e nem a dor e a felicidade do humano, não percebe o que é viver com amor, lealdade, segurança e justiça, com uma vida leal, justa e correta.

Não conseguimos viver sem consciência porque os nossos olhos estão vendados, não conseguem ver nada, as mensagens e os alimentos da alma não conseguem chegar até ela. Não conseguimos nos tornarmos rio e chorar as lágrimas da poluição, nem nos imaginarmos florestas e muito menos padecermos as chamas que incineram a relva, queima as abelhas, as serpentes e os ninhos dos pássaros.

Sendo assim, você pode ler milhões de Bíblias sem conseguir ver Deus, pode ler Marx sem enxergar o sentido de uma vida socialista e não egoísta onde tudo é de todos, muito embora conheça todos os livros sagrados ou profanos, você não colherá nada que não seja dúvidas sobre dúvidas e os limites da sua própria cegueira.

Mensagens, sabedoria, frases sagradas poderão passar debaixo dos seus olhos sem que você as perceba e elas não conseguirão chegar até você. Sabe porquê? Porque as mensagens não estão nos textos, a consciência não está nos cursos, nem na Bíblia, nem nos textos revolucionários e nem em coisa alguma, ela está em você e só é “ativada” estando saudável, em seu mais amplo sentido de sanidade ou santidade, que são a mesma coisa, sem pecados e culpas, em paz por estar agindo bem.

E o que é agir bem?  Agir bem é ser empático e ser capaz de se colocar no lugar do outro, após conhecê-los na medida em que o escuta, e estando em seu lugar, saberá o que ele sonha e ansiosamente buscam, agindo segundo os valores maiores.

Há pouco tempo eu ouvi um paciente de extrema esquerda falando sobre “fazer um curso para o desenvolvimento de uma consciência de classe”. Não se dava conta de que a “consciência” não pode ser construída de fora para dentro. Consciência de classe “criada” por cartilhas, livros e cursos, são manipulações e não podem ser chamadas de “consciência”, como algo que nasce com o outro, nos mistérios da vida em com/unidade, como o fermento que age silenciosamente no trigo e que juntos se transformam em pão. Porque a consciência, sendo criada “nos outros” e não “com os outros” não é consciência de nada e nem de coisa alguma, mas é a nossa megalomania atrevida e egoísta sendo “implantada” nos outros.

Vi também a extrema direita dizer que desejava criar e implantar a consciência, a “democracia obrigatória” e a todo custo e desejava fazê-lo com a ditadura e a guerra. Vi também a anarquia abandonar e superproteger o humano, e a “educação bancária” querendo ensinar valores sem consultar o outro e as suas bases.

Toda consciência individual ou de classe somente chega quando as nossas almas estão conjuntamente sensibilizadas ou ativadas, quando a nossa vida está empaticamente limpa, eticamente resolvida e justa, pois a consciência e o remorso inconsciente dos ricos os alienam, e os colocam num nível de superioridade que é incompatível com a humanidade.

Um rico revolucionário é tão sem poder, que é incapaz de se colocar no lugar de um miserável, é incapaz de sair do seu castelo e ir morar debaixo da ponte, porém o andarilho pode fazer o inverso, saindo debaixo da ponte para viver no castelo. Os manuais salvacionistas das religiões, de esquerda ou de direita podem ser textos vazios, confusos e sem lastro em realidade alguma porque verdadizar é uma dinâmica interior e uma construção de quem processa o que vê.

As terapias e as correntes filosóficas que desejam se “venderem” ou se verdadizarem e implementarem as suas “verdades”, mesmo que estrategicamente se apresentem como soluções para o mundo, elas são construções que não existem, serão poluições literárias e filosóficas e as suas verdades valem tanto quanto a sabedoria do “manual da geladeira da admiradíssima amiga Dra. Suely Bichuet, com quem um dia surgiu essa reflexão.

Até os manuais de eletrodomésticos ou o olhar sobre o entardecer serão capazes de acionarem a consciência, e ao contrário, os livros revolucionários não conseguirão necessariamente revelar consciências e nem sabedorias. A ativação estaria no encontro onde se processa a prática da liberdade e da criação, na percepção das razões e do sentido de estarmos aqui “para o outro” e “com o outro”, empaticamente unidos e ungidos disto que temos chamado de amor.

Quando você tem uma razão para viver, a sua ativação rumo a um sentido unicamente seu, fará com que vejas o que precisas ver e viverá para se decidir na vida, e sendo digno merecedor de sua paz, você não precisará “ser feliz” no sentido fanfarrão e romântico da felicidade para viver radiantemente bem, porque muitos no passado se realizaram na miséria dos campos de concentração, da mesma forma que outros viveram no inferno das igrejas, das doutrinas e das ideologias que prometiam a eternidade e que aparentemente desceram às trevas do inferno.

Muitos agrediram, torturaram e mataram em nome de Deus e de um paraíso inexistente, porque foram incapazes de se colocarem na pele dos bruxos, das feiticeiras e dos outros, decidindo a vida deles sem a mínima competência empática para se colocarem no lugar dos mesmos e sem saberem se isto eram bênçãos e se era aquilo que o mundo sonhava.

Não convém duvidar que isto não é outra coisa senão a demência de um “poder” arrogante que não sabe a diferença entre a vida e a morte, nem olhar o mundo através dos olhos do outro.

A Internet está cheia de frases e textos maravilhosos, porém mortos, como ladrilhos de ouro que o homem pisoteia, atropela e passa por cima sem percebê-los. Sabem porquê? Porque a sabedoria e a consciência não estão naqueles textos. Ela estaria dentro da consciência viva, morta ou cega de cada um, dentro da alma que só passa existir quando acionada e ativada [aparentemente nos momentos de angústia].

Na verdade, tudo está lá, mas ninguém vê, algo que você pode tocar, ver e até ler, mas sem estar com a alma sensibilizada, sem um “para quê” e sem se sentir digno merecedor, não conseguirás transformar nada em realidade e muito menos em verdade e vida.

Muitos vão às igrejas e aos cultos e não conseguem ouvir nada. Sabe porquê? Porque a salvação não está nos templos, nem nos textos sagrados, mas na vida limpa, engajada e bem resolvida, porque somente isto permite a ativação da justiça, do bem e da felicidade que existem dentro de você.

Estamos num momento em que quanto mais falamos, menos somos ouvidos e entendidos. Sabe porquê? Porque não é o que falamos, mas o que outro ouve naquilo que falamos que o transforma, e isto está pronto dentro dele e ativado pode ouvir e viver o que precisa ser ouvido e vivido, o que ele merece ouvir e viver, dependendo das suas culpas, do que aciona as suas coisas e as transformam em placebos, para que mediante a fé nos ofertemos o que antes não tínhamos por direito e por culpa, e não nos sentíamos merecedores.

Essa tal “felicidade” não está exatamente onde a buscamos, entretanto está à nossa disposição quando somos merecedores, diante da reverência aos valores que descendem dos nossos ancestrais no contexto das lealdades ocultas.

Por isto me parece estranho alguns ativistas serem capazes de pensar em cursos para induzirem a “consciência de classe”, como se fosse possível o adestramento da liberdade, aprendermos a ser livres e desenvolvermos revoluções. Não compreendem que os cursos para a independência, ou para sermos obrigados a perdoar “em dez passos” e coisas assim, são ideologicamente impossíveis e construíam o inconstruível sobre os outros.

Para os alienados, todos os demais são alienados, todos estão equivocados e fazem sempre a coisa errada. Todos são obrigados a perdoar, como se fosse possível obrigá-los ao esquecimento, algo tão absurdo como o machista que diz “ou você me ama livremente, ou eu a obrigo a fazer terapia para aprender a me amar”, assim como faziam os predestinadores que nunca sabiam sequer quais eram as suas mães, onde o que olha está quase sempre certo e quem é observado está quase sempre errado.

José Carlos Vitor Gomes, Psic.

Viçosa, 200125

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José Carlos Vitor Gomes Psic.

José Carlos Vitor Gomes Psic.

Atua como psicoterapeuta, psicoterapeuta familiar e de casal desde 1979. Fez cursos de especialização nos Estados Unidos, Argentina, Colômbia, Itália e no Brasil. Foi um dos pioneiros na divulgação da psicoterapia familiar no Brasil. Foi organizador de 53 eventos com celebridades nesta área com a participação de mais de vinte mil profissionais brasileiros.

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