A ética como terapia – Logoetica & Eticoterapia
José Carlos Vitor Gomes, Psic.
Editora Psy
2023
ÍNDICE
Introdução/04
O Darma/10
Viver para os outros/18
As lealdades invisíveis/25
Injustiças não existem/28
O Darma, o sentido e a logoterapia/29
Tudo acontece para o bem/37
Logoterapia e as lealdades invisíveis/39
Bibliografia/48
Dedicatória
Dedicado ao professor Ivan Boszormenyi-Nagy, M.D. que esteve no Brasil a meu convite de 3 a 5 de agosto de 1995.
Introdução
“Não economizemos amor, pois ao contrário
do dinheiro, ele somente cresce
quando a gente o gasta”.
Sigmund Freud, M.D.
A psicologia existia antes da invenção da palavra “Psicologia”, que é um neologismo incorporado pelo teólogo alemão Felipe Melanchthon por volta de 1590. A Psicologia então, não é dona de si mesma e sequer foi criada por “psicólogos”, mas por estudiosos e em geral religiosos, pessoas que hoje mal seriam aceitas se passassem às portas das instituições que dela se apropriou.
A cunhagem da palavra “Psicologia” não foi feita por nós os psicólogos, mas por um teólogo que se baseou nos conceitos gregos de psique, se referindo à alma; e logia, que significa lógus que é estudo ou ciência, e em sentido puro, “Psicologia” é a ciência que busca o conhecimento da alma.
Séculos mais tarde, a “Psicologia” como ciência formal surgiu em 1879, em Leipzig, na Alemanha, quando Wilhelm Wundt (1832-1920), filósofo e médico, formado em Alma Mater e na Universidade de Heidelberg, que era filho de pastores luteranos, fundou o primeiro laboratório de pesquisa psicológica.
Wundt foi, portanto, o primeiro homem a ser chamada de “psicólogo”, mas que era filósofo e médico, e que de tão importante, foi declarado cidadão honorário de Leipzig em 1902.
Assim, a psicologia existiu desde antes de ser conhecida como “Psicologia”, e seu objetivo era o estudo do lógus e do funcionamento da psique ou da “alma humana”.
Este é um dos objetivos do presente trabalho, que é uma reflexão reconhecendo que a psicologia começou antes de si mesma, antes da própria “Psicologia”, que a medicina começou antes da própria “Medicina” e que a preocupação com do sentido da vida, que é a essência da Filosofia, sempre existiu e também começou antes da “Logoteoria”, tanto é assim que, com exceção da Filosofia que sempre existiu, a Medicina e a Psicologia, foram descobertas e se foram descobertas é porque já existiam.
Porém a Logoterapia ou a Psicoterapia de Viktor Frankl, assim como a Psicoterapia psicanalítica de Freud, surgiram como respostas ao mal de uma época, à era do vazio existencial que foi a passagem do século XIX para o século XX, quando o homem percebe que ele não era exatamente lógico, nem normal e muito menos a suposta imagem e semelhança de Deus.
Em que pese a evolução científica e tecnológica, este é o ser humano que por vezes é soberbo, violento e arrogante, que ainda mata e se mata como na Idade da Pedra, que destrói para ser destruído, e constrói inimigos para colher vinganças na medida certa e ser emboscado, que ataca os semelhantes em guerras absurdas e seguirá praticando barbáries contra si mesmo, em favor do seu próprio mal-estar.
Todos os ataques e todas as guerras são sempre contra si mesmas e nunca terão vencedores porque os que “vencem” levam o troféu das culpas que um dia terão que ser expiadas.
O mal-estar da civilização, como dizia Freud e Frankl em suas reflexões, dão conta de que a maldade humana não sinaliza que um dia vai se acabar, ao contrário, parece que tende a continuar e os monstros de Auschwitz retornam apesar das nossas ilusões de evolução.
Isto parece contraditório se dito por um modesto terapeuta que neste momento prepara um livro com o absurdo título, um pouco inspirado em Paul Watzlawick, em sua obra sobre “A arte de ser infeliz”, em Viktor Frankl que nos incentiva a abraçarmos o sofrimento inevitável, mas imaginem alguém defender o fato de que “Tudo acontece para o bem”. Será?
É verdade. Parece absurdo, mas tudo parece acontecer para o bem. Parte dos nossos deslizes são autoperseguições, mais do que autossabotagens porque, nos convencemos de vez sobre a necessidade de passarmos por todos os castigos que nos impomos.
Talvez sejam por expiações de culpas históricas ou se devam ao que Boszormenyi-Nagy chamava de “lealdades invisíveis”, contas passadas e ocultas dos nossos ancestrais à serem pagas hoje, ou pelos males de hoje que serão heranças dos nossos descendentes amanhã.
Uma das contradições deste trabalho é que o Dr. Viktor Frankl, em alguns momentos se posicionar contra às abordagens sistêmicas por acreditar que nelas, homem perderia o tesouro que representa a assunção da posse corajosa de suas responsabilidades.
Os sistêmicos, por outro lado, acreditam que as nossas iniciativas não acontecem isoladamente, que tudo o que somos e fazemos impacta sobre os demais, tanto no sistema horizontal como na linha do tempo, no presente, no passado e no futuro de tudo e de todos.
Por exemplo, as invenções e as descobertas humanas, assim como todas as coisas interferem sobre todas as coisas; atuais, de ontem ou no futuro de todo o planeta.
Sendo assim, o Darma, o propósito, a ética ou falta dela, tudo pode transformar as pessoas e mudar o mundo como um todo. O amor, o respeito, a prática do bem e da ética, tudo pode melhorar os resultados da própria psicoterapia e promover pessoas.
No plano das lealdades invisíveis, todos estão ligados. Ninguém está livre das influências de ninguém ainda que sejam estranhos e desconhecidos. A pandemia nos mostrou que, uma pessoa infectada na China passou a matar pessoas do lado do mundo, o que em termos sistêmicos é inevitável.
É precisamente isto que acontece com os acertos das contas dos nossos ancestrais, onde o que fazemos hoje, terá que ser compensado e pago pelos nossos descendentes, e isto foi comprovado por Sheldrake, von Bertalanffy, Hellinger e Erickson entre outros.
Assim, é muito importante termos uma vida equilibrada para que os nossos descendentes não tenham que pagar pelos nossos erros, e com uma vida justa e inclinada para o bem, possamos colher a felicidade na pele dos que nos representarão no amanhã, e esta é a essência de uma psicoterapia centrada na ética.
O Darma:
A necessidade de ser o que sou, como sou e aonde sou
“Devemos crescer onde somos plantados…”
Xavier, F.C.
O significado da palavra “Darma” foi evoluindo na medida que as ideias hinduístas se desenvolviam ao longo da história. Incialmente o Darma era uma lei cósmica, derivada de Deus e revelada aos Vedas. Seu significado se refinou, e passou a ser aplicado num contexto maior na compreensão da psique, do lógus e o funcionamento das nossas mentes.
Ser psicólogo significa ser aquele que lida com sentido da psique e a Psicologia é a arte e a ciência da busca e do trabalho com o sentido, das coisas que a alma persegue por si mesma, porque esta é uma das funções e das qualidades dármicas do humano.
O Darma são os comportamentos essenciais e necessários para o impedimento do caos, para a proteção da vida e da naturea a nível individual, familiar e sistêmico. É que a vida sustentável precisa de métodos, processos e rituais que viabilizam a existência humana.
Estar em Darma, é estar em harmonia com o meio e com a vida, cumprindo com seu papel e sua função dentro de servir humano e do mundo. Em se tratando do humano, o Darma é aquilo que tem “sentido” e que existe para “o sentido”, mas isto é mais do que estarmos apenas cumprindo com as nossas funções no mundo.
Ser missionário e cumprir com as nossas funções e papéis não basta.
Um criminoso pode estar harmonizado com seu meio e isto, em si mesmo “não tem sentido” e nem ética. O Darma pessoal existe quando eu caminho para “um sentido” e com “um propósito ético” eu escolho o bem e o sentido vem.
Portanto, sermos-aí éticos no mundo é mais do que estarmos harmonizados com o meio e com o campo. Ser ético é viver com sentido e com amor, é viver para os outros, para o máximo bem e a máxima felicidade do outro, desde que o outro não seja suicida, nem criminoso e muito menos um sadomasoquista, acreditando ele ou não no sentido do amor ao próximo.
Não se trata de dar “para” receber, porque seria uma “troca” comercial e nada teria a ver com o amor. Porque o amor é dar sem necessariamente recebermos nada em troca. É servir para “vir–a-ser”, atentos ao fato de que “o outro dos outros somos nós”.
O revolver do assassino está em Darma e cumpre com sua função de matar, mas o humano existe para a expressão de sua humanidade, para cuidar e ser cuidado, e não estando alinhado com estes valores, a vida deixa de ser sustentável e se estamos num mundo sem-sentido é exatamente para a busca do sentido.
Na intimidade das relações, latejam as consonâncias e as mais profundas intenções recíprocas de compaixão e de amor. Buber alerta que não devemos “buscar” o outro e nem o encontro, porque o outro não pode ser buscado sem que o transformemos num alvo, num “Isso” ou em numa coisa, mas o encontro acontece por um milagre num momento de graça (Buber-1949).
Todas as coisas existem para um fim e se a água não mata a sede, ela perde a sua finalidade. Não existe avião que não voe e nada faria dele um avião sem voar. Todas as coisas existem com um propósito, um Darma e um “para quê”, mas para o homem há um clamor maior pelo sentido a ser encontrado, onde não importaria a razão, mas o sentido, que vai além de todas as razões e para o amor.
Então a vida é o seu próprio sentido, onde há uma voz que apela por um sentido, onde viver e termos uma razão para a viver são sinônimos e basicamente a mesma coisa.
O Darma é a fé no destino, na função e na humanidade do homem, no que nos definem como espíritos e natureza, como inconsciente espiritual que anima a carnalidade, e onde a Presença Oculta se manifesta e o faz ser-aí ético no mundo, livre, responsável e capaz de amar até mesmo quem não nos escolhem.
O amor é uma escolha não correspondida por alguém que você ama, sem necessariamente ser amado, quando optar e escolher são expressões da nossa liberdade, mas onde amar é o exercício da liberdade e o risco de uma escolha sem garantias de retribuição.
Amar sem precisar fazer uma escolha é o amor incondicional, é o amor unidirecional dos santos e é o amor do sofrimento. No amor homem mulher para cada escolha há uma série de renúncias, mas com ou sem reciprocidade o respeito é obrigatório.
A expressão do amor é o mais humilde curvar-se em reverência ao outro, é a mais sublime eleição, onde nos ajoelhamos numa atitude de quase oração e onde o amor é a mais livre expressão da responsabilidade.
No amor com objetivos conjugais, o escolhido é único e insubstituível no mundo, mas este amor só existe concretamente quando ocorre um encontro e a escolha for mútua. Nele é impossível amar sem ser amado, e neste caso quem escolhe é o escolhido e quem é escolhido é quem escolhe e não existe amor unidirecional.
Isto significa que todos os demais, embora não tenham sido rejeitados, são colocados em seu devido lugar, então ocorrem os ciúmes, pois eles parecem dizer que para cada um, existe “um cada um”, numa ética de lealdade, fidelidade e respeito.
A lealdade conjugal tem sido atacada, os relacionamentos ficaram mais curtos e menos leais e com o passar dos anos, se tornaram cada vez mais abertos, mais tolerantes e flexíveis.
Em consonância com Buber e a relação (Eu-Tu), aprendemos que não é possível escolher sem fazermos do escolhido um “alvo”, um “objeto”, o que seria próprio de uma relação objetal “Eu-Isso” e onde alguém é escolhido para “servir” quem o escolheu, então a palavra “escolha” tem sido substituída por “encontro” diferenciando bem uma coisa da outra.
Uma escolha feita por amor é espiritual e mútua e acontece simultaneamente, pois no amor verdadeiro, quem escolhe é o escolhido, e o escolhido foi aquele que antes escolheu.
Quando a escolha é bilateral e mútua ela é um “encontro” porque eles encantam ao mesmo tempo e se aproximam mais para amar do que serem amados. O encontro não tem nada a ver com sexo porque acontece entre as pessoas que amam, crianças, idosos, espíritos, seres vivos ou não e até entre pessoas que nunca se viram e talvez nunca se vejam ao longo da vida.
Eu tive um paciente que se casou à distância com uma namorada ainda nos velhos tempos da China comunista, nunca se viram e se amaram profundamente até a morte.
Tudo tem um propósito e como escreveu Santa Tereza D’Ávila, ele está no fato de que “Não existe nada neste mundo que não tenha sido imaginado há milhões de anos atrás”.
Teilhard de Chardin, 1956, ao se referir ao sentido da vida, acrescenta que o homem e o mundo estão aí para a evolução e o paradoxo está no fato de que, existindo para se evoluírem eles teriam mesmo que serem imperfeito.
A cada dia que passa evoluímos um pouco mais, e se um dia for comprovado que não é bem assim, talvez se deva à esperança deste grande teólogo, de que amanhã seremos melhores do que hoje e que cada ser que nasce é mais evoluído que o anterior na caminhada para à Perfeição.
E o que seria a perfeição senão Deus? Pergunta ele. É que o homem e o mundo marcham rumo à Perfeição até ficar face a face com este Deus ou consigo mesmo, e se darão conta de que neste grande projeto nos tornamos tudo aquilo que de alguma forma já somos.
Viver para os outros
“Estamos onde nos colocamos e onde devemos florescermos…”
O amor conjugal é uma escolha mútua e um “encontro” onde os dois se escolhem. É um movimento perfeito e recíproco, porque o amor solitário seria estéril, morto e não existiria. O amor não é uma escolha, pois quando a pessoa amada é escolhida, ela é um “objeto de prazer” daquele que a escolheu (Buber, 1949).
Na verdade, “o humano” não precisa escolher, pois sendo humano, ele é por natureza essencialmente amoroso, justo e ético. A liberdade para escolher nos relacionamentos só é um ato de liberdade e amor, quando é mútuo e assim ele passa a ser um encontro.
O que nos revelam como seres humanos é a nossa capacidade para a convivência, suportando as nossas mutações e imperfeições, padecendo as nossas culpas e arrependimentos, tolerando as dores das nossas transformações.
Somente quem ama e é realmente humano, é capaz de suportar amar sem ser amado. Mas isto é impossível para as relações conjugais, onde o amor não consegue ser incondicional.
Somente assim nos tornamos prontos para perdoar e nos abrirmos para a aceitação de nós mesmos, e finalmente tolerarmos a metamorfose das demais borboletas do Paraíso, sem o quê, seria impossível tolerar sermos humanos.
Sermos éticos e capazes de amar é um sonho e uma graça, mas embora não seja exatamente uma escolha, também não é um impulso e muito menos um tropismo. Amar é uma tendência do nosso Inconsciente Espiritual, de uma Força Ignorada que existe em cada um de nós.
Ter um corpo com um design humano, não significa que “somos humanos”, porque sermos humano não é uma escolha, mas uma contingência natural. Alguns escolhem ter um corpo com tal aparência, mas têm uma relação “Eu-Isso” com o mundo e uma alma quebrada.
Ainda assim, pode acontecer um milagre e por razões desconhecidas um monstro genocida pode se descobrir portador de um coração e nos relâmpagos do acaso passar a tocar as harpas angelicais das suas almas. É por tais razões que os humanistas se posicionam contra a pena de morte, o aborto e a eutanásia.
Não sabemos nada sobre o outro, que pode ser santo e se tornar demônio, ou ser diabólico e se salvar, ou se mostrar olimpicamente vivo estando morto. Pode fluir da anatomia do oco, do nada das suas almas e do abissal vazio de sentido estar humanamente vivo, ou quem sabe por milagre se transfigurar e se ressuscitar glamoroso, cândido e iluminado.
Mas o humano tem atributos que o define como tal dentro das mais extremas fragilidades onde nós só existimos “para o outro” que também só existiria para nós, porque “o outro dos outros somos nós”. Enquanto isto, as relações realmente humanas, só podem ser Eu-Tu quando estão mutuamente espelhadas e são éticas e onde todos são espelhos uns para os outros.
Somos o que somos em comparação aos outros, pois as nossas relações são comparativas e um é referência para o outro, onde o outro em quem me espelho tem a minha própria estatura.
Se o edifico eu me engrandeço, se o faço crescer eu também cresço, quando o diminuo eu perco a estatura da minha própria humanidade e me apequeno. O outro me espelha e eu o espelho, na mútua projeção das nossas referências.
Eu sou o espelho onde outro se projeta, e Ele é o espelho onde me projeto, e nesta metáfora somos todos espelhos das nossas mútuas faces, quando o engrandeço e sou engrandecido, amo eu sou amado, talvez como nos ensina o mestre Milton Erickson quando disse que:
“Se quero crescer na vida, eu preciso fazer com que todos os que estão à minha volta cresçam comigo”.
“Se quero ser feliz, eu preciso contribuir para que todos à minha volta sejam também felizes”.
“E se pretendo ser tratado como gente, eu preciso fazer com que todos à minha volta se sintam realmente humanos”.
Isto é o que Buber também conhecia como “relacionamento Eu-Tu”, onde eu preciso “do outro” como de mim mesmo, e o outro precisa de mim como de si mesmo. Um é “o outro do outro” e “o outro do outro somos nós”, e somos amados pelo outro como ele ama a si mesmo”.
Para os orientais, isto nos harmoniza com o Todo e nos libertam das “Rodas de Sansara” do eterno retorno e das encarnações, nos levando ao nirvana, à salvação e à felicidade, à ponto de não precisarmos mais estar aqui.
Nascemos e fazemos os nossos acertos sistêmicos diante da mais imensa contabilidade contextual, para ficarmos livres das nossas dívidas anotadas na justa planilha universal das nossas contas familiares (Nagy 1973).
As dívidas são sistêmicas. O acerto de contas faz parte da ética familiar, porque a família dá origem aos seus descendentes e se responsabiliza pelo que eles fazem, pelos ônus e os bônus, ganhos, perdas e danos.
Se o Darma é o cumprimento das funções das coisas para a garantia de uma vida sustentável, para o homem, o que importa é o sentido. Isto já era defendido por Sidarta, Confúcio e Lao Tsé, foi retomado por Cristo e aprofundado por Hegel, Martin Buber e mais recentemente por Boszormenyi-Nagy e Hellinger.
Não se trata de uma doutrina moral sobre os direitos e deveres humanos, porque as “razões para vivermos” e o Darma se referem à missão fraterna e ao amor mútuo que é o provável motivo para estarmos no mundo.
Não dá para vivermos neste mundo sem nos relacionarmos embora nem sempre sejamos amados, sem o dar e o receber, sem sermos espelhos uns para os outros para que todos se enxerguem, se encontrem uns nos outros e passem a existir. O outro é o único espelho onde posso me ver, me achar, me reconhecer, e só posso tomar posse da minha existência através do outro (Buber-1949).
Tudo o que somos, temos e fazemos no mundo depende do outro. Tudo o que o outro é, faz e tem no mundo depende de nós.
Esta é a nossa razão para viver, ser e estarmos no mundo, o que as culturas orientais chamam de Darma e que era apenas o cumprimento das nossas funções.
Estamos aqui para cuidar, e se somos amados isto seria compreensível, mas respeitar e sermos respeitados é essencial, o que para Martin Buber são as Relações Eu-Tu, onde o “Eu” é tão grande quanto eu possa engrandecer o “outro” e é “miseravelmente pior do que alguém que tornamos miseráveis no misterioso mundo dos espelhos onde o Eu e Tu se constroem.
As lealdades invisíveis
“Para o equilíbrio entre o dar e o tomar, acertamos as contas dos nossos ancestrais e os nossos descendentes, às nossas”.
Boszormenyi-Nagy
O Darma como função e como vida vivida “para os outros” e para o mundo, dentro da mais respeitosa dedicação, onde “Eu me dedico ao Tu que a mim também se dedica” embora nem sempre saibamos disto.
Assim, eu viveria a serviço do semelhante que também me acolhe ou não, não se trata apenas de um jeito de ser à nossa escolha, mas de algo inerente à existência humana.
Tudo parece ser uma romantização da vida que não seria assim tão justa, mas de fato o mundo perfeitamente justo. Alguns dizem que nem balas perdidas existem e que às vezes a vítima é pior do que o seu algoz. Em geral, ainda não percebemos os detalhes do que na intimidade da vida segue acontecendo.
Ivan Boszormenyi-Nagy percebe que há um equilíbrio natural entre o dar o receber em todas as relações, especialmente nas relações familiares. Cujo balanceamento está em nossas “lealdades invisíveis” que se organizam no campo de uma ética natural. Tudo que alguém faz de positivo ou negativo, de amor ou de ódio está numa planilha existencial de contas a serem ajustadas pelos descendentes.
As constelações familiares e a teoria dos campos mórficos de Sheldrake confirmam esta reciprocidade sistêmica e as lealdades invisíveis que estão nas famílias.
A teoria dos sistemas de von Bertalanffy e seus achados teóricos confirmam que “a família é uma máquina que funciona como um todo”, um campo equilibrador onde todos estão ligados, que funciona como um banco, compartilhando culpas e responsabilidades e a justiça onde tudo o que se faz é da conta de todos.
Que as pessoas vivem pagando pelo que os seus ancestrais fizeram não é novidade, sabemos que as relações familiares são horizontais no aqui-agora, porém verticais na linha do tempo, onde o presente, o passado e o futuro interagem, e onde o presente é fruto do passado e o futuro é fruto do presente e sobre isto não há dúvidas e o que tem de realmente “nosso” em tudo isto é a forma como lidamos com os acontecimentos.
Vai chegar um tempo em que, exercendo mais plenamente a nossa liberdade e fazendo escolhas mais responsáveis, nos ajudaremos através de psicoterapias mais evoluídas, controlarmos melhor a história, tomando a vida em nossas mãos, gerenciando o destino, controlando os nossos comportamentos e condutas com uma vida mais ética e justa, para que os nossos descendentes não tenham que pagar as contas das nossas inconsequências.
Não é exatamente nova a informação de que o futuro pode interferir no passado e curá-lo, que o passado interfere na vida de todos e que na linha do tempo; o passado, o presente e o futuro estão intergeracionalmente ligados.
A lentidão no julgamento dos processos e a procrastinação da justiça, não significa impunidade, pois os culpados e premiados serão os elementos do sistema, os nossos filhos e netos. O equilíbrio das nossas contas, será feita pelos nossos descendentes, pagando as dívidas, recebendo os “bônus” pelo amor e a justiça que possamos ter praticado.
Neste sentido, vale a pena uma vida ética e responsável, pautada pelo amor e a justiça, para que o telhado das nossas famílias não seja de vidro. Não há como se livrar da justiça do sistema ou não atuar sobre o destino dos nossos descendentes que terão que ajustar as nossas contas, o que é justo, porém indesejável.
As injustiças não existem
“Viver eticamente é uma forma de ajudar os nossos de descendentes”.
Boszormenyi-Nagy
Os conceitos de Darma, sentido da vida e o vazio existencial são complementares e se relacionam aos nossos emaranhamentos e engajamentos existenciais e aos nossos “para quês”. É que a vida saudável pressupõe condutas éticas, atitudes, comportamentos e virtudes onde o Darma se estabeleça como lei natural e pelos papeis e funções das coisas.
Em grego clássico, o Darma é estar em paz com vida que somente é vida quando tem harmonia com o que é sustentável e bom para a natureza, para a pessoa, a família e o meio social.
O Darma, o sentido e a logoterapia
O Darma se aplica à função das coisas no mundo, ao passo que o sentido é próprio do homem.
O Darma se derivava em parte do Ethos segundo o imperador Ashoka, o Grande (304 a.C – 232 a.C), da Índia, conhecido por defender ideias como a compaixão, a causa animal, a não-violência e a tolerância, uma das primeiras figuras do mundo a defenderem a liberdade de cultos e o diálogo interreligioso.
Assim, a psicoterapia centrada no sentido da vida se aproxima e se complementa com o conceito do Darma, que vem dos Vedas e do sânscrito. A coincidência está na percepção de que tanto o Darma para as coisas, como a Logoterapia acreditam que o sentido é a vida sustentável por propósitos, na realização das funções do ser adaptado e saudável que segue cumprindo o seu destino.
Quando qualquer coisa deixa de cumprir suas funções, ela cai no vazio, perde seu lugar no mundo e morre por desuso, extinta como ocorrera com o pássaro Dodô que foi visto pela última vez nas Ilhas Maurícios em 1662.
Uma vida sem desafios se recusa a continuar. O pássaro Dodô foi extinto porque encontrava facilmente seus alimentos, já não precisava mais voar e deixando de usar as asas, elas entraram em desuso e o tornou presa fácil para seus predadores e se extinguiu.
Não podemos afirmar que isto possa ocorrer com a espécie humana, mas sem retomarmos a nossa vocação, não tratando o outro como imprescindível e sem entendermos o sentido de estarmos aqui, o tempo de vida poderá ser cada vez maior, porém serão longas vidas vazias de sentido e de um ócio insuportável.
Todos os seres e coisas existem por alguma razão. Cumprem com um propósito realizando funções e finalidades, procurando seus “para quês” sem percebê-los.
A busca do sentido e a compreensão do Darma ou da função das coisas é ecologicamente correta, porque existe um lugar e uma função para todas coisas e seres, especialmente para a presença humana neste planeta que é a casa de todas as criaturas, o lugar da realização do lógus e do Darma segundo Frankl e o Rei Ashoka, o nobre imperador da índia.
Tudo converge para um fim que às vezes escapa à nossa percepção, mas está no contexto da fenomenologia existencial e espiritual ou na complexa imensidão sistêmica, cuja grandeza transcende o alcance do mundo visível.
Se a água não curasse a sede, ela se desviaria de suas funções, assim como o humano que aí está para cuidar dos outros, de tudo e do planeta e para o enfrentamento dos nossos acidentes existenciais e ecológicos.
Estamos no mundo para cuidarmos uns dos outros e do planeta embora negando esta realidade a cada minuto de cada século. Na verdade, somos guardiões do mundo e das pessoas e não temos outra razão para estarmos aqui.
Os egoístas e narcísicos diriam: “Estou no mundo para cuidar de mim que sou a pessoa mais importante do mundo para mim”. Perdoemos esta visão ridícula da vida, porque eles só pensam neles e no aqui-agora. São incapazes de perceber que “o outro para os outros somos nós” e que no amanhã incerto seremos os idosos, os terminais e os enfermos.
Cuidamos de nós mesmos enquanto somos saudáveis, maduros e fortes: mas, e quanto aos mais frágeis? E as crianças? E os idosos, os doentes e os pobres? E quanto à ecologia, a natureza e os demais seres? E quando os revezes da vida chegarem? A melhor saída é cuidarmos dos outros, porque assim todos cuidam de todos e amanhã “os outros” dos outros seremos nós.
A nossa inteligência briga conosco e às vezes trabalha contra nós. Embora sejamos capazes de evoluir e melhorarmos o mundo, seremos sempre incompetentes para destruí-lo.
Um ataque contra a Terra seria uma autossabotagem suicida, mais destrutiva para nós mesmos como espécie do que contra a natureza. Na verdade, o nosso fim poderia ser excelente para o Planeta, que deve estar cansado desta humanidade narcísica e aceitaria se livrar da nossa presença hostil, grosseira, rude e tão destrutiva para o mundo.
O humano tem sido egoísta e devido à sua fragilidade, não faz nada além de cuidar de si mesmo. Quase todas as nossas atividades são profissões de ajuda, desde que pagas. Vivermos em comunidade é importante por precisamos da organização para que a vida funcione. Zelar pelos outros é a mais significativa das atividades humanas.
Acontece que o amor é uma plantação, onde precisamos abrir mãos de uma parte das sementes para plantá-las e para que hajam colheitas, e então ocorre o milagre da multiplicação e as sementes nascem aos milhares.
Assim, a Logoterapia é também a retomada e a ampliação da “darmoterapia” que segue e começou há quatro mil anos entre os Vedas, cuja missão é nos ajudar a percebermos a função das coisas e o sentido das nossas vidas, e no que se refere aos objetos e às coisas, acharmos o destino e o propósito de tudo que existe.
A psicologia existia antes da invenção da palavra “Psicologia”, da mesma forma com a medicina, a filosofia e o Darma. A psicanálise, a psicoterapia ou a Logoterapia “não existiam antes”, pois elas foram respostas da humanidade ao sofrimento das suas épocas.
Viktor Frankl dizia que “Cada Era tem seu próprio sofrimento, portanto, que a cada momento histórico construamos novas terapias para responder às necessidades de seu tempo”, e que estejamos abertos para isto.
Assim como também, a busca por um sentido oscila segundo as angústias de seu tempo, mas que sempre existiram por serem inerentes ao humano. O cérebro humano busca o significado das coisas automaticamente (Hood, 2010), porém a alma, em outro nível segue fazendo o mesmo, porém não automaticamente, mas como um anseio livre, espontâneo e responsável.
A Medicina, a Psicologia, o sentido, o Darma e a filosofia sempre existiram e foram sendo descobertos como tais, aliás, se foram descobertos, é porque já existiam.
O propósito, o Darma e a função dos seres e das coisas, existiam antes das filosofias e das psicologias, primeiramente para o budismo hinduísta, o taoísmo e o confucionismo por terem mais de quatro mil anos, quando o mundo ainda era outro e as Terras Novas sequer existiam.
Profundamente cuidadosos, o budismo, o taoísmo e o confucionismo evitam atacar a natureza e respeitam até os insetos. A Terra é também o planeta dos insetos, somos todos importantes e todas as espécies e têm o mesmo direito de estarem aqui.
O sentido da vida, dos fatos, das coisas e os seus “para quês” existiam antes das nossas preocupações com eles e surgiram para atenderem às nossas preocupações (Nicolelis, 2020).
Novamente Milton Erickson ao se referir à “técnica da utilização”, de onde derivaram a “ressignificação”, a “prescrição de sintomas”, as “técnicas de paradoxação”, “a Intenção Paradoxal” as “Práticas negativas” de (Dunlap, 1932), propõe que, ao invés de fugirmos das nossas dificuldades, devemos abraçá-las e aprender com elas e isto pode nos curar.
Tudo acontece para o bem
Reciclando, utilizando e aproveitando tudo
o que a vida nos oferece…
Milton Erickson, M.D.
O sofrimento também é importante, então surgem as doenças porque parece que a vida quer nos treinar para a superação e ver como aproveitamos todas as coisas, inclusive as doenças que também nos curam.
Todas as doenças nos imunizam e são também vacinas naturais que com o tempo desenvolve as nossas resistências. Os problemas nos treinam e trazem as suas próprias soluções, e ao entendermos isto perceberemos o sentido vacinal, antiofídicos e terapêutico para a maior parte dos nossos males.
E por fim, quando nada mais funciona, diante de uma situação irremediável e onde não existe nenhuma solução, ainda resta uma última força que é a nossa capacidade de resistência, isto que temos chamado de resiliência.
Em quase todas as doenças estão as respostas que buscamos, e funcionam como se a vida quisesse nos dizer: “Eu sou o seu mal e a solução para quase todos os seus males” e os abraçando como se fossem presentes encontramos o propósito oculto para cada um deles.
Entendamos que “abraçar as nossas dores” equivalha a agradecê-las pelos ensinamentos que nos trazem. Não é um jogo, nem uma técnica fria e muito menos sadomasoquismo, mas a expressão da gratidão quase que num tom de oração e isto também é o que Viktor Frankl chamava de “Intenção Paradoxal”.
Acreditando nisto, entendemos melhor a evolução da Logoterapia como, Frankl, seu criador a apresenta na abertura do Primeiro Congresso Mundial da Logoterapia em 6 de novembro de 1980 em San Diego, CA, afirmando que a evolução da Logoterapia trouxe novas lentes para seu tempo.
A logoterapia e as lealdades invisíveis
“Viver com ética traz leveza a vida dos nossos descendentes, que não terão que pagar pelos nossos erros…”
Boszormenyi-Nagy
Uma psicoterapia revolucionária talvez nos recomendasse iniciarmos esta reflexão com um olhar voltado para as lealdades invisíveis, para o sentido da ética e a força terapêutica da honestidade e da justiça para a cura.
Não existe vida possível sem sofrimento, sem culpa e sem a preocupação com a finitude e a morte. Uma nova psicoterapia estaria voltada para a ecologia da alma e exigiria de nós a honestidade e a ética, talvez recomendando mais resiliência a um mundo que ainda não sabe que a evolução dói, mas que a dor protege e equilibra a evolução.
Na verdade, o mundo e a vida saudável tendem a excluir e punir tudo o que é antiético, injusto, desonesto e afetivamente enfermo.
Qualquer ser que tenha deixado de cumprir as funções para as quais existe, perde o seu status e a sua sustentabilidade, adoece, morre, sofre e se extingue. Este é o sentido da evolução, do progresso e do êxito, ou seja, estamos aí para evolução, sem o que a humanidade já não teria mais qualquer sentido.
O problema está na confusão que fazemos entre evolução, dinheiro e status. Evoluir não tem nada a ver com a melhora da conta bancária, a riqueza financeira e o exibicionismo nas redes sociais. Se fosse assim, os mafiosos e os traficantes seriam as pessoas mais evoluídas.
A missão e os deveres, compõe o sentido e o Darma individual, mas em relação ao humano esta função é diferenciada, na medida em que a nossa razão de ser e estarmos no mundo é também influenciada pelos nossos ancestrais.
Responsabilidades a gente não escolhe. Elas se impõem pelas vivências no contexto do sistema familiar. Somos livres para agir e fazer escolhas, mas a conta chega e as responsabilidades e as consequências se impõem.
Na verdade, não se trata exatamente de uma imposição, mas das consequências das nossas escolhas, algumas das quais foram feitas pelos nossos ancestrais, que estão nas nossas células, construindo um destino compartilhado e por razões sistêmicas vão equilibrando as contas de todos.
Temos que tomar cuidado com as imagens vinculadas à nossa identidade a um determinado corpo físico. Não somos os nossos corpos. Somos um DNA que transita e se manifesta através dos nossos corpos que é “água e sais minerais” e sequer é muito diferente da carcaça dos demais animais.
No meu estudo sobre “A função dos mortos” tive que criar o conceito de atravessabilidade para mostrar que não enxergamos “com” os olhos, mas através deles, não pegamos com as mãos, mas através delas e sequer andamos “com” os nossos pés, mas através deles.
O Edson Arantes do Nascimento não foi o “Pelé”, mas seu corpo foi um portal que deu passagem para que algo se manifestasse através dele e que foi a lenda chamada “Pelé”, alguém que jogou “através” do Edson, e assim por diante. Somos portais para a expressão de uma certa Presença Ignorada e oculta que passa através de nós.
O homem é o seu espírito, seu amor e a sua capacidade para o “encontro Eu-Tu” e se encontrando podem viver com ética. Todas as coisas transcendem as suas dimensões biofísicas, que embora se manifeste “através” de um corpo com um certo design, este corpo é um acidente evolutivo para melhor realizarmos os nossos desígnios.
O que os nossos ancestrais fizeram de bem ou de mal ao longo da vida influencia a vidas dos seus descendentes. As planilhas das nossas contas existenciais herdadas exigem seus respectivos acertos, para que a qualidade de vida de cada um de nós seja menos determinada por heranças passadas e para que as nossas vidas tenham o menor impacto possível sobre os nossos descendentes, para que eles não tenham que pagar as nossas contas.
Assim, a vida parece ter um sentido individual e um sentido sistêmico. O individual repercute sobre o sistema e o sistêmico impacta no individual. O humano entra em “comunhão” em sua comunidade, que embora pareça algo pacífico e religioso, na verdade, é o lugar do nosso encontro real com o bem e todas as crises próprias dos nossos encontros e desencontros.
A responsabilidade é assumida queiramos ou não inconscientemente, em dois níveis; em primeiro lugar pela família como anfitriã dos seres que ela inventa, escolhe e decidiu hospedar no mundo. Em segundo lugar, ela somente poderia existir se for o lugar do sentido e da educação.
Ser família é quase que por definição ser o lugar da “educação”, do cuidado, do zelo, do amor, onde o GPS e a razão humana se instalam quando ela opta por guiar, abraçar o sentido e sua função educadora e de guia.
Não tem como viver neste mundo perdido, perigoso e automático, onde tudo depende de treinamento, linguagens e códigos, sem estarmos educados para a missão, e esta é uma das principais responsabilidades da família.
Esta educação é possível porque a família já estava inserida na comunidade, neste lugar sagrado onde os seres se comungam – ou se excomungam – onde assumimos desde a nossa língua e os nossos valores, todos os códigos e demandas, nos preparando para nos inserirmos em igualdade de condições no mundo.
Assim, a família deve oferecer o mapa e conectar a pessoa que ela inventa e hospeda às suas funções, ao seu Darma e a um sentido.
O ser se prepara como os fios de um tecido, para a imensa tecelagem da vida onde o meio social é o tecido, o sistema que dá o suporte essencial para que a pessoa realize a sua vocação no mundo. Não existe nenhum ser que não tenha uma razão para viver, mas viver com sentido é algo que vamos construindo como seres errantes no tempo.
E assim, vamos sendo cortados sob medida para atendermos ao nosso chamado, assumindo o nosso Darma e o sentido exclusivo como seres únicos e irrepetíveis e substituíveis no mundo, que em geral se faz em “comunhão” com todos os demais na “comunidade”, o lugar da “comum unidade”, da união e da desunião, na trama tecida que se tece entre a vida pessoal, familiar e social que é o lugar onde nascemos como seres que clamam por um sentido.
A família é o lugar da educação. É o cais, a plataforma de partida para uma vida significativa. Porém, família somente é família quando é formadora, quando mãe é mãe e com amor faz maternagem, quando pai é realmente pai e com ética, limites, justiça e amor faz a sua paternagem.
Ser família, é ser mais do que uma máquina biológica geradora de filhos. Não existe a assim chamada “família biológica”, pois sendo apenas biológica, ela estaria muito longe de ser uma família. Ser família, além do romantismo que envolve o tema, é o “acolhimento” afetivo, ético, amoroso, são os limites, a maiêutica, a luz e o parto que gera o ser espiritual e humano.
Famílias somente são famílias quando cumprem seus propósitos na criação de uma responsabilidade grande o suficiente para guiar quem ela escolhe hospedar de forma saudável, estimulando a expressão da máxima da gentileza e da humanidade.
Desta forma, uma psicoterapia efetiva para o século XXI, se faria estimulando a educação, o amor e vivência da ética e já existem todas técnicas e quase toda tecnologia para este fim!
Uma família saudável gera vínculos de amor, com limites e respeito aos valores humanos e éticos, educando para a gentileza, para a liberdade e a responsabilidade, para a diversidade e a harmonia com a natureza.
“Não há como ser saudável sem sermos éticos. Todas as nossas dívidas são curadas pela família que é o lugar da aprendizagem do ajuste de contas, que se expressam nas lealdades invisíveis que se concluem no dar e no receber”. (Nagy -1973).
As lealdades inconscientes se equilibram entre o dar e o tomar, e nos mostram que as contas familiares inevitavelmente são pagas pela própria família, e que as suas contas serão herdadas por seus descendentes (Nagy–1973).
Na falta de ética como doença, somam-se os que ficam felizes com as neuroses alheias e ganham com elas. Para eles, a incompetência sabotadora das falsas relações de ajuda acaba sendo um bom negócio. Eles precisam ser apenas técnicos frios e não precisam entender nada do que fazem!
São os vampiros codependentes e os doentes iatrogênicos explorando os que buscam ajuda, são as máquinas profissionais gélidas de uma nova era, seres que mal se conhecem e nem precisam disto.
Nestes casos, é bom saber que lágrimas não são commodities. Que a lei da Oferta e da Procura não se aplica ao mundo das lágrimas.
Que a psicologia já existia antes da criação da palavra “Psicologia”. Que terapias não funcionam como fast foods e que as pessoas estão procurando sentido e autoconhecimento além da “cura” se é que as curas existem. O que é cura?
E como disse um professor sobre a questão da “fabricação da loucura” e dos combos enlatados que mais ajudam os profissionais vampiros do que seus pacientes: “Mais de um século das psicoterapias e o mundo cada vez pior” (Hilman-2000).
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